sexta-feira, outubro 21, 2016

mas nem sequer ouviste o que eu não disse


Não, não feche os olhos, não feche as mãos!
Fique dispersa na ventania,
deixa que teu cabelo se perca no céu
perca teu senso!
Não, não cruze os braços...
sinta a chuva que encharca a noite...
Não, não parta, não leva, não deixa,
a tua ausência,a tua moldura,tua tela em branco.
Esse teu jeito de girar,girar,girar...
esse teu sorriso movendo a felicidade
destes estancados homens perdidos.
Esse olhar que se põem atrás das nuvens,
que espera os segundos de suspense
para se revelar transparente,
translímpido, amante.
Esse teu falar de sussurros roucos
que gelam a conduta corporal,
ecoa nas ruas,atravessa as praças
e chega ate mim,
apenas um ouvinte!
Há o dito seguinte
que se a palavra não veio é por que os olhos
retiveram sua beleza,
mas fora tão desejado dizer,
quanto então ouvir e olvidar.
Não era o lugar o alto
no salto de se revelar,não, não feche as mãos;
no instante de se confundir,não, não feche os olhos;
no tempo ao vento
sabias que eras a luz mais bela,
o fogo que mais ardia,
e eu tentava te dizer
num canto do sistema solar
que era preciso voar
para se distrair
mas já não podias me ouvir.

segunda-feira, outubro 10, 2016

sempre








Ao caminhar pela noite
o homem solitário pensa
que de todas as possibilidades
ele é a mais remota.
A sua rua é torta,
o seu passo é confuso
e quando alguém se apressa
em ter com ele
algumas palavras de protesto,
ele sussurra a sua canção
misteriosa,
ele sorri em seu silêncio,
ele se encolhe em seu vazio.
Não é solitário, está por aí.
Certamente não olha
as janelas das casas,
não se atira sobre as salas,
às varandas, pelas portas.
Seu gesto é contido,
embriagado de censura
vaga entre ilusões passageiras.
Precisa ser livre, mas está preso
aos costumes,
às estrelas e às suas lendas.
Precisa do grito,
da força,
de asas.
Se cruzam o seu caminho:
(e sempre cruzam)
há de notar todo olhar
com certo jeito vadio:
ainda é criança, criança é ainda ademais.
Conversa com o poste da esquina,
fala de amor em palavras perdidas,
engole artigos suspeitos
e rasga o peito, o chão:
seu riso é lágrima!
A noite é triste para esse ser
esquecido nas ruas, nas praças de outrora!
e quase sempre ele ri!
e quase sempre ele chora!
quase sempre ele sempre
caminha sonhando e sorrindo...

domingo, outubro 09, 2016

Como esCulpir um Colar






Dessa noite de outono retire

uma fotografia.

Pegue linha de nylon 0.5

e faça a escolha da ponta.

Corte um pedaço da escolha

diagonalmente

e queime e prense com delicadeza.

Enlace a imagem com o fio:

quatro lances de contorno,

bem cerzidos.

Pegue pedras – preciosas ou imprecisas – coloridas,

de todos os tamanhos, de todas as texturas.

Escolha o pequeno pedaço de pedra que pretende

teus olhos e teus olhares

e o extraia de sua origem.

Com cuidado, dê-lhe significado,

explique-o embora não o saiba.

Dê-lhe notas dissonantes

diminutos acordes, experimente...

Prepare naquim  e verde-oliva

para retocar as presilhas,

use ganchos perolados.

Prenda tudo com precisas nuanças

e fazendo mudanças de luar,

retire o ar e deixa

que o coração se acalme.

Sinta-o completar a alma,

lave-o com o corpo,

tome-o com a distância.

Então, de súbito, prenda

com toda delicada

presença

teu colar: amor,

no contorno da amada!